1# cartas de uma irmã mais velha
Para a menina que achou que precisava aguentar tudo para ser forte.
Tem uma hora na vida em que a gente começa a perceber que “ser forte” nunca foi sobre poder, mas sobre sobrevivência. Você não aprendeu a ser forte porque quis. Aprendeu porque teve que ser. Porque não tinha quem segurasse tua mão quando tudo desabou, então você teve que juntar os cacos no chão, enfaixar os próprios machucados e levantar com o joelho tremendo.
E foi ali, nesse improviso emocional, que você começou a acreditar que ser forte era bonito. Que era isso que te fazia valiosa. Que era isso que fazia os outros te notarem. E, de certa forma, era verdade. As pessoas notam. Elas dizem que te admiram. Mas elas não ficam. Porque ninguém fica pra cuidar da mulher que cuida de tudo. No fundo, você sabe que o mundo ama o que você faz, mas não ama você.
Ser forte virou identidade. Mas uma identidade construída em cima do medo. Medo de ser um fardo, de ser fraca, de não ser suficiente, de decepcionar.
Então você nunca pede ajuda. Nunca mostra cansaço. Engole o choro, mascara a dor, dá um jeito. E quando dá errado, porque uma hora dá, você se culpa. Acha que falhou por não ter conseguido sustentar tudo sozinha, como sempre. E ninguém percebe esse colapso. Porque pra todo mundo, você “tá sempre bem”.
Ninguém imagina que sua “força” já virou exaustão crônica. Que você se sente invisível mesmo no centro do furacão. Que, às vezes, você desejava que alguém dissesse: “Ei, deixa eu cuidar de você agora.”
Só que isso quase nunca acontece. Porque ser forte é confortável… pros outros. Enquanto você aguenta, ninguém precisa mudar. Ninguém precisa fazer sua parte. Ninguém precisa crescer. Ninguém precisa fazer o mínimo por você.
Você segura o emocional da família, o funcionamento da casa, o caos do trabalho, os traumas mal resolvidos dos outros, os silêncios doloridos dos seus relacionamentos, tudo como se fosse normal. Como se fosse natural você viver engolindo o mundo e ainda agradecer por isso.
Mas sabe o que é mais cruel? Ninguém vai te dar um prêmio por isso. Ninguém vai te aplaudir. Não vai ter festa, não vai ter reconhecimento. Só vai ter mais do mesmo: mais cobranças, mais demandas, mais solidão.
Tudo bem, porque não era pra você buscar reconhecimento nisso. Era pra você reconhecer que isso te destroi. Que esse vício em ser necessária, em ser forte, em ser admirada por “dar conta” é só uma forma sofisticada de desespero. Uma forma de pedir amor sem parecer fraca. Uma forma de se proteger do abandono ocupando um papel funcional. Mas você não é uma função. Você é uma pessoa. Que sente, que cansa, que precisa. E tá tudo bem se hoje você não der conta.
Você pode achar que se permitir descansar vai te fazer perder quem você é. Mas, na real, é esse descanso que vai te lembrar de quem você foi antes de começar a carregar o mundo inteiro.
Antes de acreditar que só seria amada se fosse indestrutível ou de confundir força com abandono de si mesma. Porque a verdadeira força, cara leitora, é poder dizer “não”. É parar. É soltar. É se recusar a viver de performance. É aceitar que ninguém vai te salvar e ainda assim escolher se salvar.
Então para de buscar aplauso onde nunca vai ter. Para de esperar reconhecimento de quem só te valoriza quando você sangra sem fazer barulho.
E começa, ainda que aos poucos, a lembrar que você pode ser mais do que isso. Pode ser suave. Pode ser cuidada. Pode ser só você, sem ter que provar nada pra ninguém.
Se você se vê como uma pessoa engraçada, não vai ser afirmando isso em palavras que as pessoas vão começar a te achar engraçada também.
Você não precisa continuar se provando pra merecer existir. Ser humana já basta.
Quem te ama de verdade não vai te pedir pra ser invencível. Vai sentar do teu lado quando você não conseguir levantar. E até isso acontecer, que você aprenda, sem culpa, a sentar consigo mesma. A descansar sem pedir desculpa. A existir sem se justificar.
Porque ser forte não é sobre aguentar tudo. É sobre saber quando parar. E ter coragem de escolher a si mesma, mesmo quando ninguém mais escolhe.
Esse é um texto escrito para minha eu do passado, sei que ela ainda não estava pronta para aceitar que estava na hora de parar de “suprir”, mas quem sabe você esteja.
Obrigada por ler!